terça-feira, 15 de agosto de 2017

O luto na expressão da vida

O luto é um momento que vivemos ao nos depararmos com alguma perda. Em geral relacionado com a morte (fim do que compreendemos ser a vida), pode também ser associado ao término de relacionamentos afetivos, diante da demissão de um trabalho de anos ou em situações de abandono.
Quando sentimos que perdemos algo, que ficou um vazio, surge o luto e junto a ele sentimentos como revolta, raiva, tristeza, culpa...

Elisabeth Kübler-Ross, uma psiquiatra suíça, propõem no livro “Sobre a morte e o morrer” (1969) 5 fases pelas quais passam as pessoas ao viverem o estado de luto, sendo: negação, raiva, barganha/negociação, depressão e aceitação. A ordem das fases pode variar, mas é comum que todos passem por elas para que consigam chegar ao processo de elaboração dessa dor, a dor de ter perdido algo significativo.

Capa do Livro: Sobre a Morte e o Morrer, Elisabeth Kübler-Ross (Fonte: divulgação)

A Cabana um drama escrito em 2008 (William P. Young) e que tornou-se filme em 2017, relata a história de Mack (Sam Worthigton) que apresenta uma mistura de revolta, dor e culpa após o sumiço de sua filha mais nova durante um acampamento de família. O filme, que tem um tom místico/espiritualista descreve o encontro desse homem com Deus, mas não é o “Pai” apresentado por algumas religiões como sendo distante, que vigia e que puni. Deus, Ele, ou melhor Ela (Octavia Spencer) nesse drama, não se restringe a fé religiosa (que é inegavelmente importante para diversas pessoas), mas vai além!

No encontro com Deus, Mack é convidado para um movimento de reaproximação íntima, é chamado para produzir pão, para cuidar do jardim, para passear de barco, para fazer trilhas na floresta e para encarar sua dor. Todos esses momentos são repletos de simbolismo e convocam esse homem (e a quem sentir vontade) a continuar o processo de elaboração de sua grande perda.

Capa do Livro de William P. Young - A cabana (Fonte: divulgação)
Quando temos uma dor enorme em decorrência de uma perda e jogamos essa dor para debaixo do tapete, fingindo não existir, ou ao persistimos no estado de revolta ficamos estagnados. É como se algo estivesse parado, porém o corpo começa a dar sinais de que alguma coisa não está fluindo dentro de nós (hipertensão descontrolada, insônia, depressão, aumento do colesterol...). 

Toda dor deve ser respeitada, toda dor deve ser acolhida, toda dor deve ser vivida. Só é possível a elaboração a partir da aceitação da dor, por maior que ela seja.

Há pouco mais de 30 dias minha família materna viveu uma perda, e ainda está em processo de luto. Espero que todos possam viver a dor para que ela seja elaborada sem subterfúgios, sem máscaras, sem vitimismo, apenas acolher e aceitar a dor para que ela se dissolva. Sinto que estamos buscando formas de nos fortalecer enquanto família, nos unindo e permitindo que o outro se aproxime mais, e isso tem sido muito rico e valoroso.

Toda dor deve ser respeitada, toda dor deve ser acolhida (Fonte: imagens google)

Dia desses uma pessoa muito querida me perguntou:
-Qual o oposto da vida?
-A morte! Eu respondi.
-Não, o oposto da vida é o nascimento!

Cada um pode interpretar essa resposta do modo que lhe for mais familiar, eu interpretei como sendo o nascimento de novas oportunidades, o nascimento de mudanças, o nascimento de um olhar sobre o que não era visto. Quando algo é perdido (morre, vai embora, ou somos obrigados a nos separar) temos ali a possibilidade de vários nascimentos.

O oposto da morte é o nascimento (fonte: imagens google)

Então, diante da perda tenho buscado observar e responder: 
-Quando um ciclo se fecha, qual ciclo está sendo aberto? 
-Quando há morte, o que está tendo a oportunidade de nascer?        

E você, já parou para se perguntar: diante de meus lutos, o que poderá nascer?

Beijos e até o próximo post!

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Comida: uma forma de expressar afeto (em Buenos Aires)

Lembro-me de cenas antigas relacionadas a comida que instintivamente me fazem recordar de bons momentos de afeto[1]. O cardápio não é tão requintado, mas as lembranças a que me remete são! 

Macarronada, frango e maionese aos domingos na casa dos avós maternos. Almoço de domingo era dia de correr com os primos na rua, de querer jogar bola com os meninos maiores e não poder (“Vocês são carta branca”, diziam os grandões da rua), era dia de tomar chá mate e comer pão, à tarde, com mais umas 30 pessoas da família.

Maionese na casa dos avós maternos! Comida para um batalhão!

Na casa dos avós paternos era um quitute melhor que o outro! Meu avô fazia pipoca (dessas que se estoura na panela). Ele chamava todas as netas e dizia que se não cantássemos, a pipoca não iria arrebentar. O enredo era sempre o mesmo, uma música de um comercial de guaraná (quem aí conhece?), 

“pipoca na panela, começa a arrebentar, pipoca com sal que sede que dá...”

Era infalível, era mágico! Todos os milhos estouravam! Sem a música, sem meu avó e sem suas netas essa pipoca não teria o mesmo sabor. Percebem? Isso é comida e afeto.

Comer guarda algo fantástico em si, mas cozinhar, ah! Cozinhar é um grande ato de afeto! Por meio da comida oferecemos energia, amor, desejos, expressamos prazer e desprazer. Alguém já foi em um restaurante no qual a comida tinha gosto da casa da vó, ou da mãe, do pai, tio, ou alguém que lhe marcou bem no estômago (rsrs)?

Cozinhar é um ato de puro amor! Quem oferece comida, oferta (se desejar) sua essência. Em um dos meus aniversários resolvi que tudo o que foi servido seria produzido por mim com a ajuda de familiares. E assim fizemos! Do bolo, aos biscoitos, antepasto de berinjela e bombons. Mas porquê isso? Naquele momento, eu queria me reconectar com o afeto e minha forma de expressão foi essa – a comida.

Doces do aniversário: bolo indiano com frutas e bombons (Arquivo pessoal)


O filme mexicano “Como água para Chocolate” (1992), baseado na obra de Laura Esquivel, retrata exatamente a relação entre comida e afeto. Sua teia gira entorno de Tita (uma jovem cozinheira), de Pedro (apaixonado por Tita) e do amor impossível que lhes circunda.

Em cada cena Tita evoca nos alimentos aquilo que ela sente. Em um trecho do filme ela se vê obrigada a cozinhar para o casamento de Pedro, com outra mulher, e ao preparar o bolo da festa Tita chora muito, resultado? Bolo bonito, bolo gostoso, e convidados chorando. Como disse, onde há comida, há afeto (podendo ser ele bom ou ruim) e a película expõe (talvez de forma aumentada) o poder do alimento e da relação estreita entre ele e as formas de afeição.

O filme é um clássico, com uma fotografia linda e cenas bem picantes (não sei informar a classificação), mas vale assistir! 

Cena do Filme "Como Água para Chocolate", momento no qual Tita está preparando: 
Codornas com pétalas de rosa!
(Fonte: google imagens)

No consultório ouço pessoas reclamando que não recebem carinho de familiares, mas ao olhar com cuidado acabam descobrindo que o fato de não receberem o carinho do modo como esperam não atesta a inexistência do amor, nem a falta da expressão do afeto. Muitas vezes a afeição foge do tradicional “beijo" e "eu te amo”.

Afeto também está presente em gestos como, “comprei esse doce para você”, “o que você quer comer hoje?”, uma fala de incentivo, ou ao fazer uma brincadeira para o outro sorrir e até mesmo nos momentos de silêncio. São infinitas as formas de cuidado e atenção.

Bem, e o que esse texto tem a ver com Buenos Aires? Eu o escrevi durante a viagem para lá, um momento de encontro comigo mesma de reconectar-me a minha essência! Até pude cozinhar para mim (depois explico isso melhor)! 

Resolvi prepara uma massa com camarão e brócolis!
Como dizem os Argentinos 'Mui rico'! (Arquivo pessoal)
E a cidade? Ela é linda, arborizada, cheia de teatros, e de gente conversando “apaixonadamente” (gesticulando e falando alto). Há um café em cada esquina, e é um hábito entre os portenhos frequentar esses lugares para conversar, comer, ler jornais. O Café Tortoni (fundado em 1858) foi onde tomei um dos melhores café com leite e fui muito bem atendida, vale a visita!

Esse é o Café Tortoni, localizado na Av. de Mayo, em Buenos Aires (Arquivo pessoal)

Eis meu singelo café da manhã no Tortoni! Delícia! (Arquivo pessoal)


Por fim, sugiro repensarmos os padrões sociais de expressão do afeto (isso não quer dizer aceitar abusos!) e nos perguntarmos como temos recebido, mas principalmente, como temos ofertado?

Beijos no coração e até o próximo post!





[1] Afeto aqui refere-se a tudo aquilo que toca (afeta), desse modo, pode ser também algo negativo.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Aprender a viver com você mesmo (a): um rico exercício para uma existência saudável

Oi pessoal, estava pensativa sobre qual texto inserir no blog e decidi falar sobre um tema bastante significativo para mim: estar bem com você mesmo para ficar saudável.

A receita da felicidade pode ser, para algumas pessoas, o dinheiro de sobra ou a ausência de conflitos durante a vida, no entanto, acredito que um dos caminhos para essa tal felicidade tenha a ver com aprender a conviver bem consigo mesmo. 

Quem aí gosta de ficar sozinho com seus pensamentos? Quem consegue chegar em casa e deixar a TV desligada, não acessar as redes sociais e ficar realmente em paz com alguns minutos de silêncio? Grande desafio (eu sei!), mas dar-se um tempo para silenciar a agitação é necessário para que haja um encontro com quem nós somos (ou estamos) nesse momento.

No atendimento psicológico é comum o incomodo do cliente[1] diante do “ensurdecedor” silêncio, o silêncio que grita, que extrapola o pensamento e é extravasado no corpo em reações de ansiedade (como: bater os pés, roer as unhas) e desconforto (tensão nos ombros, dor de cabeça).

Ninguém é obrigado a ficar calado (e nem deve!), mas se falamos só por falar, sem que haja conteúdo, podemos perder a oportunidade de pontuar algo que seja significativo, deixando de contribuir para nossa vida e quem sabe, para a vida de quem está ao nosso lado. Mas, para que surja um conteúdo profundo do que é falado, é necessária a reflexão e consequentemente o contato com nosso mundo interno.

Está expresso na música “Certas coisas” (Composição de Lulu Santos – adoro a versão do Lenine) que “não existiria som se não houvesse o silêncio”. O silêncio é o lugar do som! É necessário que se cale para que se escute, para que a fala reverbere. Por isso, devemos silenciar os sons internos (pensamentos, emoções) e externos (os outros) para que ocorra esse encontro entre silêncio e som.


Silêncio e som são complementares e geram o equilíbrio. Crédito: Caroline Celico

Nenhum extremo é bom, nem isolamento total do mundo externo, nem doação total de si ao outro. No primeiro caso, vale ter cuidado para não criarmos um distanciamento entre nós e os outros em prol da ideia de ‘ficarmos sozinhos para sermos saudáveis’. Nesse caso, lembro-me do filme “Comer, rezar e amar” (2010).

No filme, Elizabeth (Julia Roberts) decide fazer uma longa viagem por diferentes partes do mundo para que ela possa se encontrar, visita Itália, Índia e Bali (uma belíssima ilha da Indonésia). Na última fase de sua viagem ela percebe que o recurso da meditação lhe auxiliava nesse encontro interno. Durante suas andanças acaba conhecendo e se apaixonado por Felipe (Javier Bardem), um brasileiro que vive na ilha. Elizabeth entra em crise ao notar que, por estar apaixonada, afastava-se de seu tão ‘sonhado’ equilíbrio interno e passa a questionar seu envolvimento afetivo com Felipe.

Em um diálogo do filme (vídeo abaixo) o curandeiro Ketut diz a Elizabeth que as vezes perder o equilíbrio por amor faz parte de viver a vida em equilíbrio.  Ele não fala de perder-se no sentido de abandonar quem se é, mas de abdicar ao controle total para viver algo significativo com alguém significativo.


              
                                  
                                                Trecho do filme: Comer, Rezar e Amar (2010)


Pode ser que digam: mas isso é só um filme! Sim, porém baseado em uma biografia de Elizabeth Gilbert, e o curandeiro Ketut existe! Vocês podem encontrar mais informações sobre ele clicando aqui: História do Ketut. No mais, acredito que o que ele sugere a Elizabeth é algo a se pensar...


Olha aí o Ketut verdadeiro! Crédito; Faz Kashani

No outro extremo, o medo de viver sozinho com quem se é, pode gerar pessoas dependentes afetivamente, que não conhecem seu potencial e acabam alimentando relações simbióticas, não havendo espaço para elas mesmas. O tempo de dedicação ao outro (chamado de amor) é tão grande que incita a falta de amor próprio. Dedicação total ao outro não é amor, pode ser várias coisas dentre elas fuga. Isso mesmo, ao dedicar tanto tempo e energia ao outro deixamos de nos haver com nossas dores e características que merecem atenção. Pois, ao olharmos para nós mesmos aumentamos as chances de mudanças internas, mas isso exige tempo e esforço.


Assim, o exercício de viver só consigo mesmo para alcançar uma vida saudável é um desafio. Mas como podemos encontrar nossa essência e manter a plenitude? Creio que cultivando o equilíbrio entre o mundo interno e externo.

Imagem do Filme Comer, Rezar e Amar. 
                   
A tod@s nós, um bom exercício! 



[1] O termo cliente é proposto por Carl Rogers e utilizado na abordagem psicológica humanista. 

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

“Trem Bala”: finitude e infinitude são complementos da vida!

O carnaval chegou (e eu amo)! Com ele vem muita alegria e diversão, mas para algumas pessoas vem também, apenas mais um momento “fugaz” e superficial.  A proposta do post de hoje é fazermos uma leitura da música “Trem Bala” (Ana Vilela) e uma analogia com o significado mais simples e profundo da vida. 

Então, vamos comigo?

No ano de 2016 a jovem Ana Vilela, nascida em Londrina/PR, passou por uma situação pessoal que lhe moveu a escrever a letra da música “Trem Bala”, gravou um vídeo no qual ela interpreta a própria canção (você pode assistir ao vídeo clicando aqui (vídeo autoral) e compartilhou com amigos via whatsapp. Esse vídeo viralizou pelas redes sociais (só no youtube foram mais de 5,5 milhões de visualizações) e a música tornou-se uma referência quando se trata de viver a vida com o que ela tem de mais significativo.

Quando ouvi a música pela primeira vez fiquei encantada com tamanha sensibilidade, e após algum tempo comecei a me perguntar, o que fez com que as pessoas se sentissem tocadas por essa letra e melodia?
   
Nesse mundo que exige ter mais do que ser mais, ouvir uma música que nos faz refletir sobre a necessidade de viver o inverso de tudo isso (ser ao invés de simplesmente ter) parece uma boa proposta.

Muitos em sua rotina diária podem se identificar com isso: corre-se contra o tempo acumulando bens e deixando as relações para o segundo plano (alguém aí se reconhece?), creio que a maioria de nós sabe e já está fatigado de manter esse ritmo desenfreado, corre para pegar o menino na escola, para arrumar a casa, para cumprir prazos no trabalho, para ser melhor diante do chefe e ‘do que’ os colegas (e assim conseguir status e um aumento), ficar até tarde no trabalho para terminar aquele afazer interminável. 

Mas, e a vida?

Qual o sentido da vida? (Fonte: imagens do google)

Suponho que seja exatamente aí onde a música nos toca. Sinto que a principal pergunta da melodia é: vale a pena tudo isso?  

“Trem Bala” descreve a importância das relações mais íntimas (amigos, família), diz de fortalecermos laços, estarmos disponíveis para que sempre tenhamos essas pessoas por perto:


“É sobre ser abrigo
E também ter morada em outros corações
E assim ter amigos contigo
Em todas as situações”



Eu carregando um dos amores de minha vida. (Arquivo pessoal)

Ela relata a necessidade de termos fé e otimismo na vida, de que estamos em um espaço infinito enquanto aqui vivemos, e ao mesmo tempo lembrar-nos que há a finitude da vida. É como o carnaval, naquele momento os dias de folia parecem infinitos, porém “todo carnaval tem seu fim”.
Parece um contrassenso eu sei, mas, enquanto há vida existe um mundo infinito para explorarmos, é disso que ela fala, mas se utilizamos o tempo vivido apenas para acumular e ter, ou para viver de modo superficial e fugaz, a vida se esvai e ‘fica para trás’, daí ela nos lembra que somos finitos, que há um tempo para se viver e propõe que vivamos com mais qualidade do que quantidade.


“É saber se sentir infinito
Num universo tão vasto e bonito
É saber sonhar”

“Também não é sobre correr
Contra o tempo pra ter sempre mais
Porque quando menos se espera
A vida já ficou pra trás”


Entre o ser e o ter, Ana também relembra um ensinamento: o aprendizado está na caminhada e não na chegada. Vivemos competindo, querendo ser melhores, concorrendo, derrubando e nos esquecendo: qual o conhecimento adquirido nesse processo? Eu cresci com ele, ou serviu apenas para acumular? As relações foram profundas ou superficiais? Quem estará comigo lendo meu epitáfio?


“Não é sobre chegar no topo do mundo
E saber que venceu
É sobre escalar e sentir
Que o caminho te fortaleceu”    


Sei que no ocidente não gostamos de falar sobre a morte, mas ela é a realização dessa finitude (finitude apenas nessa vida, para quem acredita). E aí lembrei-me de um projeto antigo que realizei na faculdade, intitulei de “Epitáfio: o bem viver, a vida saudável e a busca da felicidade”, a proposta era escrever pequenos textos (como os que publico aqui). Pedi a amigos e a familiares que respondessem a seguinte pergunta: O que você faria para ter uma vida mais plena se tivesse seu tempo contado? O que mudaria em sua vida hoje? Como faria dessa vida a melhor possível?

Recebi respostas lindas, cheias de significado, profundas e acredito que ao lembrarem-se da finitude é que essas pessoas puderam entrar em contato com a vida! Vida e morte estão lado a lado, não como algo funesto e terrível, mas como ciclos naturais do viver.



 A beleza da vida está em descobri-la em cada momento simples, porém profundo. (imagens: arquivo pessoal)

Por fim, deixo uma das respostas que recebi sobre minha pergunta (do Epitáfio) e na sequência a letra de ‘Trem Bala’.

Beijos, bom carnaval e lembrem-se, “a gente é só passageiro prestes a partir”...


“Bom, eu passaria mais tempo com as pessoas que eu amo, pois esta é a minha maior dificuldade hoje: conciliar trabalho x família x formação.

Mudar: eu tentaria ser menos ansiosa, pois isto faria com que eu vivesse cada momento, seja ele bom ou ruim (uma vez que nem tudo são flores) de maneira mais serena, aproveitando a vida mais plenamente e menos sofrida.

Diria mais “eu te amo”, seguiria a máxima de Renato Russo: ‘É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã, porque se você parar pra pensar... na verdade não há’”. (M.N.)


Trem Bala (Ana Vilela)

Não é sobre ter
Todas as pessoas do mundo pra si

É sobre saber que em algum lugar
Alguém zela por ti
É sobre cantar e poder escutar
Mais do que a própria voz
É sobre dançar na chuva de vida
Que cai sobre nós

É saber se sentir infinito
Num universo tão vasto e bonito
É saber sonhar
E, então, fazer valer a pena cada verso
Daquele poema sobre acreditar

Não é sobre chegar no topo do mundo
E saber que venceu
É sobre escalar e sentir
Que o caminho te fortaleceu
É sobre ser abrigo
E também ter morada em outros corações
E assim ter amigos contigo
Em todas as situações 

A gente não pode ter tudo
Qual seria a graça do mundo se fosse assim?
Por isso, eu prefiro sorrisos
E os presentes que a vida trouxe
Pra perto de mim

Não é sobre tudo que o seu dinheiro
É capaz de comprar
E sim sobre cada momento
Sorriso a se compartilhar
Também não é sobre correr
Contra o tempo pra ter sempre mais
Porque quando menos se espera
A vida já ficou pra trás

Segura teu filho no colo
Sorria e abraça Seus pais
Enquanto estão aqui
Que a vida é trem-bala, parceiro
E a gente é só passageiro prestes a partir

Laiá, laiá, laiá, laiá, laiá
Laiá, laiá, laiá, laiá, laiá

Segura teu filho no colo
Sorria e abraça teus pais
Enquanto estão aqui
Que a vida é trem-bala, parceiro
E a gente é só passageiro prestes a partir 


domingo, 12 de fevereiro de 2017

A vida é feita de mudanças, de impermanência...

Pensar que algo na vida está sob nosso controle é tão tolo quanto querer “secar gelo”. O processo de mudança é inevitável, seja ele de ideia, biológico ou de desejo. Podemos nos valer do conceito de impermanência para nos auxiliar no exercício do desapego, já que ele nos remete ao fato de que tudo está em constante mudança e que não há um pleno controle sob os acontecimentos da vida. 

A transformação da lagarta em borboleta é um exemplo de impermanência da vida

Recentemente conversava com uma senhora de 75 anos que relatou detestar a velhice. Ela é uma mulher autônoma que prática atividades físicas regulares, viaja constantemente, mas sente-se infeliz por não conseguir aceitar as mudanças cronológicas em seu corpo, “o corpo já não responde mais como antes” ela me dizia, e de fato, com o passar dos anos o organismo torna-se outro, demandando da pessoa mudanças comportamentais que sejam condizentes com esse ciclo, além da necessidade de atualização de sua autoimagem para conseguir (de modo saudável) acompanhar esse novo momento da vida. 

No livro “O amor nos tempos do cólera” de Gabriel Garcia Marquez, Firmina Darza e Florentino Ariza, amam-se desde a juventude, mas por diversos motivos não puderam estar juntos, após anos (já na velhice) reencontram-se tendo a oportunidade de viverem esse amor. Nessa altura da vida eles já não têm deslumbramentos de adolescentes, há uma consciência de que seus corpos modificaram-se significativamente ao longo dos anos, no entanto, o desejo existente na juventude permaneceu vivo. 

Capa do Livro: O amor nos tempos do cólera de Gabriel Garcia Marquez (Fonte: imagens google)


Creio que esse seja o ponto, nossa mente é quem (em geral) dita as regras para se ter uma vida saudável e congruente, e compreender o processo de impermanência pode auxiliar (e muito) nessa etapa, na qual o tempo pode ser um aliado ou um vilão, cabendo a cada um de nós a escolha de qual papel ele ocupará.

No ocidente as pessoas são criadas para pensar que mudar significa descartar o que é velho, gerando a necessidade de se ter algo novo, haja vista, o consumo desenfreado e a volatividade das relações afetivas. Desse modo, associa-se o termo mudança com o que é novo e jovem, aumentando assim a dificuldade de aceitação e compreensão de que: nada e ninguém permanecerá eternamente do mesmo modo.

Hoje temos “velhos-jovens” de 50, 60 anos que vivem de modo inconsequente e desmedido, sem absorverem da vida o seu aprendizado, deixando as futuras gerações 'orfãs' de conselhos e ponderações. Não me entendam mal, fato é que de nada adianta envelhecer e ficar escondido dentro de casa (vejam o vídeo abaixo) essa não é a solução, porém, qual o sentido de se viver longos anos sem alcançar os ensinamentos que a vida pode proporcionar?

Propaganda de uma empresa de telefonia: "perigoso mesmo é ervilha!"


Outro livro que aborda (indiretamente) o tema da impermanência e da importância de compreendermos que cada ciclo de vida tem sua beleza, é o “A ciranda das mulheres sábias” da mesma autora de 'Mulheres que correm com os lobos': Clarissa Pinkola Estés. Livro fininho e de fácil leitura, diz da importância da troca entre diferentes gerações, de reunirem-se para compartilhar o que têm em abundância conforme o tempo vivido, sendo a energia da juventude ou a sabedoria da velhice. “Ser jovem enquanto velha, velha enquanto jovem”, é o subtítulo do livro e bastante sugestivo, não acham? Ele quer dizer que não há um movimento de exclusão entre o novo e o antigo, eles são complementares!


Capa do livro: A ciranda das mulheres sábias de Clarissa Pinkola Estés (Fonte: imagens google)

Acredito que impermanência, consciência de si e aceitação andam de mãos dadas e podem ser boas escolhas para quem deseja envelhecer com lucidez e sabedoria (seja ainda jovem, ou para quem já alcançou a velhice), caso contrário, de que nos serve envelhecer?

Por fim, deixo uma frase atribuída ao filósofo Heráclito:
                                            
                 "nada é permanente, exceto a mudança"...

Então, que estejamos disponíveis para as mudanças que a vida nos reserva. 

Beijos para tod@s!

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Gentileza gera gentileza: a arte urbana que reduz desigualdades

Oi gente! Tudo bem?!

Hoje vou escrever sobre o grafite e sua contribuição para reduzir as desigualdades sociais.  

No dia 22/01/17 (domingo) participei de um curso em BH, o “Pedalando pelos muros”, organizado pela equipe de uma galeria de arte chamada Quarto Amado. A proposta do curso era percorrer 14 km da cidade em cima de uma bike para conhecer uma parte da arte urbana existente aqui.

Artista Amoni, local: Praça da Estação, próximo ao viaduto Santa Tereza
 (Fonte:arquivo pessoal)

Painel pintado por diversos artistas, Local: Floresta (Fonte:arquivo pessoal)

Fui conferir de perto a história e o sentido do grafite em BH por vários motivos: uma amiga querida me convidou, por amar arte, adorar bike, e atender no consultório adolescentes e jovens (e conhecer esse universo me aproxima mais do mundo deles), então, bora lá!

Ao observar os grafites pude perceber um pouco do que ali está expresso, o trabalho realizado demonstra o estilo de cada artista, suas denúncias, manifestações, olhares. A artista Criola é um exemplo disso, uma jovem que retrata em seus desenhos o gênero e a raça e ao destacar a mulher negra ela faz uma discussão social por meio do grafite quanto a inserção dessa mulher no mundo, qual lugar é ocupado pelas mulheres negras na sociedade?, e a partir daí surgem várias outras questões que perpassam o tema.


Trabalho realizado pela artista Criola (Fonte: arquivo pessoal)

Outra imagem marcante está ao lado do “Espaço Comum Luiz Estrela” que é um antigo hospital da polícia militar e encontra-se abandonado, ele é vizinho do Cepai (Centro Psíquico da Infância e Adolescência/Fhemig) no bairro Santa Efigênia, e foi foco de várias manifestações populares que desejam transformá-lo em um centro cultural


Espaço Comum Luiz Estrela, fotos do ante e depois (Fonte: imagens google)

O nome Luiz Estrela vem de uma homenagem a um morador de rua que vivia na região, Luiz era dado a encenações teatrais e outras expressões artísticas, ele era uma 'estrela' conhecida por ali, apresentava um quadro de doença mental e veio a falecer. 

Abaixo, temos a imagem retratada no portão do Espaço, ela inspirou a capa do CD “Camaleão Borboleta” da banda mineira Graveola (para quem quer conhecer mais sobre a banda, olha aí a página deles: http://graveola.com.br/camaleao/).  


 
Grafite no portão do “Espaço Comum Luiz Estrela” (Fonte:arquivo pessoal)

A arte urbana nos muros é uma forma de expressão da subjetividade humana, nela há manifestações e denúncias, como o trabalho da artista Magrela em parceria com Thiago Alvim e Priscila Amoni, no qual faz alusão à tragédia de Mariana que acabou com vidas e toda a história de uma população.

A mulher (a esq.) tem em sua cabeça um barco, sua cor marrom (cor de terra)  insinua a lama que inundou Bento Rodrigues (tragédia de Mariana). Grafite de Magrela, Thiago A. e Priscila A. (Fonte: site Quarto Amado)


Em um momento no qual São Paulo teve uma onda de tinta cinza tomando conta da cidade e vários trabalhos foram apagados (inclusive o maior painel a céu aberto da América Latina, que foi pintado por mais de 200 artistas), a prefeitura de Belo Horizonte decide fomentar um projeto (similar ao existente na gestão do prefeito anterior), no qual incentivará a produção de grafite em painéis espalhados pela cidade, o nome será “profeta gentileza”. Esse é um meio de estimular os artistas locais e incentivar a difusão dessa arte urbana.
Vide matérias:



 Tirinha do "Armandinho",  os grafites apagados em Sampa!
(Fonte:https://www.facebook.com/tirasarmandinho/)

O grafite é um recurso artístico muito rico (como vários outros, a música, a dança) e extremamente atrativo para jovens. Ele serve como um meio de dar voz as periferias, colocando para fora sentimentos e ideias. Além disso, a arte urbana (como os duelos de MCs) faz com que esses jovens apropriem-se da cidade, conhecendo novos espaços e saindo de seus territórios de moradia.

O rosto de meninos pintados de palhaço do artista
Nilo Zack, estão espalhados pela cidade e viraram
inspiração para uma coleção do
Ronaldo Fraga
(a arte das ruas nas passarelas)
Fonte: imagens google.


É importante compreendermos que a arte não é somente aquilo que conhecemos, várias são as formas de expressão artística. Criamos uma grande barreira quando olhamos para o mundo do outro, e por não fazer sentido, nos fechamos as diversas realidades. Nesse ponto, a antropologia tem muito a contribuir, ela faz com que o pesquisador “adentre à tribo” e compreenda esse outro mundo, eis uma forma gentil de buscar reduzir as desigualdades.

Quem sabe já é hora de fazermos o mesmo? Que possamos nos abrir ao mundo do outro, pois, “gentileza gera gentileza”!

Abraços.   
 

Para mais informações sobre esse curso, acessem o site do Quarto Amado: http://www.quartoamado.com/pedalando/#curso

Obs.: esse post não seria possível sem a contribuição das queridas Taymerê Fonseca e Maíra Bittencourt, obrigada pela parceria.